sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Quarentinha



O temido Quarentinha, artilheiro do Botafogo do final dos anos 50 e início dos 60, não sabia a quantidade de gols que marcou ao longo de sua carreira: calcula-se que tenha passado dos quinhentos.

Jogou no Paysandu e no Vitória-BA, onde estreou bem e continuou marcando gols em todas as partidas, tornando-se o artilheiro com 31 gols. Foi transformado em ídolo e a figura mais comentada do campeonato de 1953, ganho de maneira brilhante pelo Vitória, em cuja ofensiva contava além dele Quarentinha, com mais dois fura redes de primeira: Juvenal e Alen.

Ele era uma máquina de fazer gols. Foi artilheiro do Campeonato Carioca por três vezes consecutivas: em 1958, com dezenove gols; em 1959, com 25; e em 1960, com outros 25. Quarentinha era um artilheiro frio, que pouco vibrava com seus gols, mesmo quando garantiam importantes vitórias do Botafogo. Isso aborrecia os dirigentes e o tornava indiferente perante a torcida. Sua explicação jamais convenceu: “Eu era pago para marcar gols. Não fazia mais que minha obrigação”. Sobre isso o ilustre Botafoguense Armando Nogueira escreveu certa vez: “Sempre que o via voltando da área, cabisbaixo, eu o imaginava a parodiar, bem baixinho, os versos de Manuel Bandeira: “Faço gol como quem chora / Faço gol como quem morre.” Era uma flor de melancolia o Quarentinha. Que Deus o tenha.”

Era também um pouco irresponsável. Gostava da noite e gastava seu dinheiro em farras. Suas atuações caíram e o presidente Paulo Azeredo, para castigá-lo, atendendo a um pedido do treinador Gentil Cardoso, emprestou-o ao Bonsucesso, cujo técnico, o duro Zezé Moreira, exigia disciplina no time. Mas o castigo que pretendiam dar em Quarentinha foi um tiro que saiu pela culatra: ele terminou o campeonato de 1956 como vice-artilheiro, com 21 gols, um a menos que Valdo, do Fluminense. A vingança de Quarentinha se completou com a vitória do Bonsucesso sobre o Botafogo por 1 x 0, gol dele. Por isso voltou para General Severiano no ano seguinte.

Na Seleção Brasileira estreou contra o Chile, no Maracanã, pela Taça Bernardo O’Higgins. Marcou dois gols na goleada de 7 x 0. No segundo jogo, no Pacaembu, marcou o gol da vitória (1x 0), quando faltavam 10 minutos para terminar o jogo. Mas os sonhos de disputar uma Copa do Mundo terminaram com uma contusão no menisco direito.

O paraense Waldir Lebrego - Quarentinha, porque tinha na escola o mesmo número 40 do pai - Encerrou sua carreira em General Severiano, em 1965, depois de uma vitória fácil sobre o América por 3 x 0, três gols seus, aproveitando passes de Gérson, o Canhotinha de Ouro. O dirigente Brandão Filho quis agradá-lo com elogios e tapinhas nas costas. Quarentinha respondeu que era tudo falsidade e acabou vendido ao América, de Cali, Colômbia, e lá terminou sua carreira de temido artilheiro.

Quarentinha, é o maior artilheiro da história do Botafogo com 308 gols em 446 jogos. Jogando ao lado de Didi e Garrincha, fez história no Botafogo. Tem a melhor média de gols da história da Seleção Brasileira: 1 gol por jogo (17 jogos e 17 gols).

Comentários de Armando Nogueira Sobre Quarentinha



“Quarentinha, eu o vi jogar muitas e muitas vezes. Era um chutador temível, um atacante de respeito, que fazia tremer os goleiros, fossem quem fossem. Tinha na canhota o que, então, se chamava um canhão. Chutava muito forte, principalmente, bola parada. Era de meter medo. Nos jogos Botafogo-Santos, era ele, de um lado, o Pepe, do outro. Ai de quem ficasse na barreira.

Quarentinha nasceu no Pará, filho de um atacante que lhe herdou, intactos, o chute poderoso e o apelido. Não sei se o pai era tão tímido quanto o filho. Quarentinha jamais celebrou um gol, fosse dele ou de quem fosse. Disparava um morteiro, via a rede estufar, dava as costas e tornava ao centro do campo, desanimado como se tivesse perdido o gol.”

Fonte: Botafogo Paixão - O Site da Torcida Botafoguense
Artigo original: www.botafogopaixao.kit.net




* * *



O dia de Quarentinha

por Gerson Soares

Mané ficou batendo bola com meu irmão Gilson, dono de potente chute, e eu naquele campinho situado atrás da minha casa. Gilson gabava-se da força do seu pé esquerdo. Não tinha talento para conduzir a bola. No entanto, realmente sabia bater muito bem nela.

Desafiou Mané a ir para o gol e tentar agarrar pelo menos uma bola chutada por ele. Mané gostava de desafios, foi para o gol. Gilson chuto cinco vezes, três para fora do campo, uma, o chão, arrancando tufos de grama, e uma outra Mané defendeu sem maiores dificuldades.

Meu irmão saiu aborrecido, havia perdido uma aposta e seu castigo era estudar. Mané tentou animá-lo, disse que aquilo acontecia, em dias em que nada dá certo. E para exemplificar, falou de um jogo do Botafogo na Argentina.

“Quarentinha era um atacante conhecido pelo forte chute. Talvez o único no time que tinha coragem de cabecear uma bola cruzada por mim, geralmente com chute forte também. E as bolas da época eram mais pesadas. O Botafogo jogava contra o Velez. Lá pelos minutos do primeiro tempo, Quarentinha recebeu um lançamento e partiu em velocidade, livre. Levantou a cabeça para saber o local exato onde chutaria a bola. O goleiro estava com o braço levantado, tranqüilo, despreocupado, apontando para o bandeirinha. Ele estava impedido e o árbitro marcou. O goleiro olhou para ele e riu. Quarentinha partiu em minha direção e pediu: 'Mané, esse goleiro me sacaneou, está brincando com a verdade. Role uma daquelas para mim, que eu vou enfiar esse cara para dentro do gol com bola e tudo.”

Mané prosseguiu a narrativa, após rápida pausa:

“Fui mais uma vez à linha de fundo, procurei Quarentinha e rolei na medida, como ele pedira. Ele chutou o chão, como você, Gilson, e a bola foi pererecando lentamente para as mãos do goleiro, que novamente olhou para o nosso atacante e fez um gesto provocativo, negativo, com a cabeça. Quarentinha ficou ainda mais furioso, queria a todo custo acertar um daqueles violento chutes. Seu objetivo era acertar o peito do goleiro. No intervalo, ainda O a O, ele foi para um canto do vestiário. Não queria falar com ninguém. Nem prestou atenção ao técnico. Aproximou-se mais uma vez de mim e me implorou: ‘Garrincha, por favor, role outra daquelas...’”

A resposta de Mané:

“Vou tentar, Quarenta, mas o jogo de hoje não está fácil. Os caras estão marcando em cima e forte.”

“Isso não é problema para você. Pelo amor de Deus, me deixe frente a frente com aquele goleiro” – implorou Quarentinha.

Mané se entusiasmou:

“Meninos, no segundo tempo Quarentinha tentou uma três vezes e o chute não saia como ele desejava. E olha que o homem tinha uma bomba naquele pé. O pior é que o goleiro realmente debochava dele. Mas não adiantava. Quanto mais vontade tinha de acertar, mais falhava. Houve uma que ele furou bisonhamente. O goleiro riu alto. O árbitro percebeu e lhe chamou a atenção. A um minuto do fim, houve uma falta na meia-lua. Quarentinha arregalou os olhos, olhou para o goleiro, pôs a bola na marca com carinho, virou-se para mim e disse: ‘Ah, Mané! É agora. Era a oportunidade que eu precisava. Pode ter certeza de que dessa vez arranco a cabeça daquele cara.’ E se preparou para bater a falta. Ficamos ao lado da bola, eu Mestre Didi e Quarenta, que pediu ao Mestre permissão para bater a falta. Quarentinha, com a permissão, tomou grande distância, apertou o laço da chuteira, suspendeu as meias, deu mais uma olhada terrível por cima da barreira, formada por sete argentinos, para saber onde estava o goleiro. O árbitro apitou. Ele bateu com a ponta da chuteira no gramado e partiu para a bola. Distante da bola, ganhou velocidade. Mas quando estava a três metros dela eu chutei e fiz o gol. Todos correram para me abraçar e eu fugia de Quarentinha, que queria me pegar. Depois, no vestiário, vitória assegurada, consegui amansar Quarentinha dizendo que pelo menos ele não arrancara a cabeça do goleiro.”

Fonte: Mundo Botafogo/Estrela Solitária
Artigo original: mundobotafogo.blogspot.com


* * *

Link para o livro: www.livrariacultura.com.br